quinta-feira, 9 de maio de 2013

Oitavo dia – 13 de abril de 2013 (Zampa)



tipo de ponte mais comum


Oitavo dia – 13 de abril de 2013 (Zampa)

 Terminei o relato anterior falando de internet. Volto ao assunto. Em muitos lugares os hotéis não tem e quando tem wireless, prevalece o “less”, ou numa tradução livre; "lerda". Fazíamos malabarismos – mudávamos de quarto, de posição nos quartos, íamos para corredores, etc.. em busca de saciar nosso vício, nossa dependência mental para com esta coisa tão fluída, intangível e imaterial. Aliás o sinal da telefonia em geral é bastante ruim. Dentre as operadoras, a mais presente é a Vivo. Newton que tinha chip  dessa operadora navegava com mais facilidade. As demais nem dão sinal e quando dão, não funcionam. Em alguns lugares, na tela de meu celular de dois chips (vivo e tim) apareciam três operadoras! Mas, nenhuma funcionava! Aliás, isso dos sinais de telefone virou piada. Como Newton sempre viajava à frente – a L200-Savana estava com carga e tem menor torque que a Xterra -  sempre que nos aproximávamos dos lugarejos e cidades, sabíamos que ele estava tentando achar sinal pelos sintomas que sua Savana mostrava: menor velocidade e movimentos oscilantes! Newton passou a ser nosso buscador oficial de sinal telefônico.
         Devem ter notado que as metas imaginadas, ainda em Salvador, não tem sido atingidas. Como disse, isso não tem a menor importância para nós, mas indica que as estradas estão menos transitáveis e que temos tido que conduzir com menor velocidade. Hoje estamos saindo de Cotriguaçú/MT as 08:30 hs. no horário de Brasília, uma hora a menos no fuso horário de Mato Grosso. Descobrimos que a maioria dos lugares do lado leste de MT simplesmente ignora o fuso horário oficial do Estado e segue o de Brasília. Aqui não. Imaginamos que hoje chegaríamos a Machadinho do Oeste, já em Rondônia. Não chegamos. Essa é uma parte do percurso que não consta dos mapas impressos e nem dos digitais (Google, Igo, etc.), portanto as informações preliminares pouco valem. No Google, por exemplo, não existe ligação entre Cotriguaçú e Colniza e nem entre essa e Machadinho do Oeste. Ainda bem que o mundo real é diferente do virtual, por mais que alguns não acreditem nisso…

 Abastecemos as viaturas com o diesel mais caro até agora: R$ 3,24! Cerca 50% mais caro do que tínhamos encontrado em alguns outros lugares. Não adiantava chorar. Esse assunto de diesel merece uma nota: por aqui o mais comum ainda é o S-1800, as vezes o S-500, portanto os felizes proprietários de viaturas 2012 em diante - que só bebem diesel S-10 -  não devem se arriscar por estes lados! Só há postos com tal combustível às margens das grandes rodovias e estas já estão asfaltadas! Quando o combustível se disseminar por estes lugarejos, é possível que as estradas entre eles estejam também asfaltadas, e aí, bye bye off road!
Chega de conversa: pé na estrada!
Ainda nos arredores da cidade, povoado de dezenas de serrarias – toda gente reclama da derrubada das matas,  mas sonha com  um móvel de mogno, não é? – erramos a saída. Descobrimos o erro ao perguntar a um homem que voluntariamente tapava buracos da estrada. Demos uns doces ao filho de uns 10 anos (balas: reconheço que o duplo sentido da palavra é meio assustador, como espantado me fez ver isso Elisio Macamo, um amigo moçambicano). Voltamos uns 05 quilômetros e encontramos a placa de sinalização que havia passado despercebida: a “TransNoroeste, compra e venda de gado” fazia o papel que caberia ás autoridades rodoviárias. Agradecemos os votos de “Boa Viagem” e tomamos o rumo indicado . 
 Cerca de uma hora depois pensamos que a estradinha – comparem com as fotos de outras estradas que postamos – estaria interrompida ao vermos um trator e equipe trabalhando numa ponte. Por aqui, na maioria das vezes, não são as estradas que impedem a passagem, mas as pontes frágeis que são levadas pela força descomunal das águas.



Estavam recolocando as pranchas sobre os troncos que cruzavam o riozinho. Esses, felizmente, estavam lá e alinhados. Passamos sem dificuldade. Poças e atoleiros meio velhos e até mesmo alguma poeira na estrada, parecia ser a rotina, mas não tardou muito e topamos com mais uma cena parecida com as que relatamos, mas de conseqüências mais graves: uma carreta (bi-trem) carregada de madeira serrada, vindo de Colniza, não tinha conseguido subir a ladeira lisa e enlameada e voltado de ré sem controle: retorceu-se toda, espalhando a carga. Parecia uma cobra morta. Estava ali há três dias.

 Não havia como passar pelo leito da estrada. Tivemos que arranjar um desvio pela lateral, entre a estrada e a cerca de uma fazenda. Literalmente abrimos caminho. Dentre os muitos veículos que esperavam, um Palio decidiu nos seguir. Passou porque era “morro abaixo”.    Como disse, a cada quilometro a sensação de que a mata estava querendo fechar a estrada se confirmava. Passamos por lamaçais e pequenos atoleiros sem problema.

 Algum tempo depois encontramos uma L200 parada. O destino deles era Nova União (que também não existe nos mapas) e o motorista alegou que a bóia do combustível estava alta. Na verdade era mesmo falta de diesel. Mais uma vez fomos solidários e Newton cedeu uns litros da reserva que tínhamos comprado e até então não usado. Quiseram pagar mas Newton disse que não era preciso. Tínhamos passado por Nova Esperança e a seguir por Nova União. Por aqui tudo parece não somente ser novo, como precisa ostentar essa condição em seu nome. Espero que os moradores tenham realmente reforçado as esperanças e a união.

Tocamos adiante entre uma paisagem que oscilava de pastos – próximos aos vilarejos – quanto de mata cada vez mais exuberante, chegamos pelas 14.00hs a Colniza, onde almoçamos, e seguimos adiante, obedecendo a placa que indicava nosso destino: Guariba, Rio Roosevelt, Três Fronteiras. Mas quando saímos já era por volta das 15:00hs e intuímos que dificilmente iríamos chegar à balsa do Roosevelt e menos ainda chegar a Três Fronteiras, porque nuvens ameaçadoras pareciam querer despencar sobre o mundo, num dilúvio reeditado.

Quase uma hora depois da saída, chegamos ás margens do belo e caudaloso Rio Aripuanã e nos admiramos que fossemos atravessá-lo por uma ponte de madeira de mais de 200m e não por balsa, como ocorrera em rios semelhantes. As marcas de água na parede de um boteco, precariamente equilibrado às margens, mostrava que o rio tinha, recentemente, passado mais de um metro por cima da ponte.
 


 As nuvens pesadas seguiam ameaçando. Pouco adiante cruzamos com uma boiadinha cujos bois estavam surpreendentemente magros. Certamente alguma doença ou vermes os tinham atacado, pois falta de pasto verde não podia ser. Não tardou para que encontrássemos outro “animal” típico daquelas bandas da Amazônia: o “jerico”. Sim, jerico! Essa espécie local é uma geringonça, obra humana, montada com peças e sucatas de vários carros diferentes movidos a um motor diesel estacionário! Até corrida oficial existe! Uma das fotos não ficou boa, mas a outra mostra o feliz proprietário dirigindo um deles.
 


Atoleiros de maior vulto foram aparecendo, mas já estavam meio secos. Pena que a chuva que caía era fraquinha. A forte ficara na ameaça. Teria sido ótimo atravessar alguns deles repletos de lama!


O dia se findava e o lindo por do sol emoldurado pela floresta, demarcava nosso caminho. 


  A noite caiu e seguimos pela escuridão. Pelas nossas contas Guariba não estaria distante. De fato, cerca de uma hora e meia depois, lá chegamos pelas 19:30hs. Procurei me informar onde ficava o restaurante e hotel do João e Noeli, com quem havia falado por telefone antes de partir de Salvador. Casal muito simpático e gentil. Nos hospedamos no hotel deles (o único, aliás) e, como sempre, fomos em busca de uma cervejinha e comida. O filho deles indicou dois lugares: o Skinão, segundo ele mais movimentado, e um outro, próximo ao hotel, que estava abrindo as portas naquele dia. Decidimos ir conferir o primeiro. Nenhum movimento. Optamos pelo novo que, ao menos, tinha uma meia dúzia de pessoas. Tomamos “Cristal” e comemos uns espetinhos e fomos para o hotel dormir. No dia seguinte, no café da manhã, João nos perguntou se tínhamos visto o que se passara no Skinão ou se tínhamos ouvido os tiros pois o gerente do mesmo, lá pelas 22:00hs tinha sido assassinado a tiros! Motivo: ele colocara sua filha menor de idade e juntara outras meninas na lanchonete para “atrair” clientes. Não se afirmou que havia prostituição. De qualquer modo aquilo tinha gerado denúncia no Conselho Tutelar e a polícia tinha ido alertar para parar com a prática. Parece que havia parado, mas sua filha andava envolvida com homens adultos e naquele dia tinha saído desde a tarde para beber numa festa nas redondezas da vila. O pai foi lá “tirar satisfação”. Horas depois, um dos participantes da tal festa veio à cidade, disparou os tiros à queima roupa, montou na moto e embrenhou-se mundo afora.  Ainda bem que lá não estávamos!

Um comentário:

  1. Olá Zampa,
    estou adorando as aventuras de voces e aqui no trabalho, morrendo de inveja. O blog ficou com um visual belíssimo e os relatos são verdadeiras aulas sobre a realidade desse nosso Brasil, que poucos tem a oportunidade de conhecer.
    Força e mandem notícias.
    bj
    Marcia Barral

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